DÁ INSTRUÇÃO AO SÁBIO, E ELE SE FARÁ MAIS SÁBIO AINDA; ENSINA AO JUSTO, E ELE CRESCERÁ EM PRUDÊNCIA. NÃO REPREENDAS O ESCARNECEDOR, PARA QUE TE NÃO ABORREÇA; REPREENDE O SÁBIO, E ELE TE AMARÁ. (Pv 9.8,9)

terça-feira, 28 de abril de 2009

Graça Abundante


Na primavera de 1992, exatamente às 02 horas da manhã do dia de nosso Senhor, fui profundamente traspassado pelo dúlcido amor de Jesus. A graça de Cristo veio sobre mim como o cicio delicado que suaviza o calor da rosa, mas não destrói suas pétalas.

Orávamos desde as 24 horas e 30 minutos rogando ao Senhor sua santa e melíflua presença. Sentia-me antes como uma casca seca de uma árvore centenária; desgastada pelo tempo, maltratada pelo rubro soturno do verão. Ouvia a oração dos santos como o crepitar da madeira que, plúmbeo, arde ao fogo. A súplica de cada crente parecia valiosas raízes e cascas sendo queimadas, como incenso suave e adocicado nas chamas da súplica, da intercessão e da ação de graças. As intempéries taciturnas da vida desfaziam-se a cada emanação e sopro do Espírito.

O templo estava em construção. Os vergalhões expostos semelhavam-se aos vergões de muitos irmãos que eu conhecia. Sabia que as pedras daquele organismo eram vivas, engastadas na santidade, piedade e contrição. Éramos, sim, pobres, tínhamos os mesmos entraves de qualquer igreja local, mas o Espírito jamais deixara de manifestar-se em nossas minudências. A Graça é incomensuravelmente maior do que nossos pecados e fraquezas.

Enquanto clamava ao Senhor, solicitando abundante graça, veio sobre mim o Espírito de Deus de uma forma que nunca dantes experimentara. Lembro-me do meu batismo no Espírito Santo, de certa forma até consigo descrevê-lo, mas esta nova experiência é quase inenarrável. Talvez não deva ser contada, como se fosse um segredo somente meu e de nosso Senhor Jesus Cristo, a quem amo incondicionalmente. Nunca disse a minha doce Ana Paula, aos meus rebentos, ou aos meus amigos mais queridos. Até mesmo os que presenciaram essa inaudita experiência também pouco saberiam descrevê-la. Era íntima, interna, pessoal e intransferível.

O Espírito do Senhor pairava sobre mim como a pompa sobre o ninho. Todo calor e proteção eram perenes, incomunicáveis em vernáculos terrenais. Ainda ouvia a oração dos santos, tudo ao meu redor era perceptível. Até que, repentinamente, um ardor, um fogo que não se consome, traspassava-me espírito, alma e corpo. Tornei-me como um vaso que trazia dentro de si uma inesgotável fonte de águas cristalinas. Chorava. Copiosamente chorava. As lágrimas eram incontidas como as de uma comporta rompida.

Lembro-me muito bem do sentimento que a alma inundou. Senti um misto de amor e benignidade, misericórdia e cuidado; tudo como se fosse uma só coisa, mas completamente diferente, divisível. Enquanto vertia minhas lágrimas, entoava minha canção silenciosa ao Eterno. Goteava dos límpidos olhos, meus temores, anseios, sonhos, esperanças. Oh! Inaudita Graça do Salvador!
Num átimo, enquanto lacrimejava meu bulício, passeava diante de meus olhos muitas etapas e fases de minha vida. Vi minha infância sem vulto paterno, e o adolescer ressabiado. Vi eventos vulníficos que se desenrolavam diante de minhas pálpebras. Passou fulvo por meus olhos o dia em que atravessei a Getúlio Vargas, RJ, em frente ao Campo de Santana, sem os cuidados necessários e um veículo parou desesperadamente diante de minha figura esquálida. Por muito pouco não fui ceifado, pensei. Vi outros retratos sem moldura ... não os lembro.

Todavia, enquanto as lágrimas ainda faziam seu trajeto, de minha face até os odres divinos, eu via, em cada uma dessas cenas, o anjo do Senhor protegendo-me, guiando-me. Não ouvia nenhuma voz, mas o Espírito testificava ao meu espírito que eu nunca estivera sozinho, muito menos solitário. Deus cuidara de mim como um pai amoroso e atencioso cuida de seu filho mais pueril. Não se tratava de preferência, mas de cuidado, necessidade e amor.

Naquele instante prorrompi altissonante louvor. Já passávamos das 05 horas e tudo passou-se tão depressa, como um átimo de tempo. Agradeci ao Senhor por todo o seu amor, atenção e cuidado. Entendi que isto é o que chamamos Graça. Sim, o imerecido e incomensurável amor divino manifesto em nossa frágil vida.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Retratos de Minha Infância Pentecostal



Nasci no dia 25 de junho de 1970 na mesma região que deu ao Brasil o poeta da tristeza, Augusto dos Anjos, o literato Ariano Suassuna, o músico popular Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga entre outros grandes vultos paraibanos que enriquecem o país com seu brilhantismo célico.
De acordo com o relato oral de minha doce avó, vim a este mundo antagônico numa humilde casa no bairro da Liberdade, enquanto a chuva celebrava altissonante o seu balé mágico sobre as rudes telhas de barro cozido feitas pelo meu avô. Deu-me o nome de Esdras em homenagem ao escriba e sacerdote judeu do Antigo Testamento, responsável pela educação dos israelitas cativos na Babilônia. Com este nome e a importância desse personagem para o povo judeu, pouco sei dizer se o meu interesse pela educação é cumprimento profético, estigma ou fatalismo.
Aos oito anos, ainda na aurora de minha infância inocente, a priori, sem qualquer conhecimento da doutrina pentecostal ou da suposta refutação cessacionista, fui batizado no Espírito Santo com evidência inicial de falar noutras línguas, conforme o Espírito concedia. Ainda lembro-me do dia 09 de novembro de 1978 como uma data altaneira. Recordo-me da melíflua presença do Espírito sobre mim, como se estivesse imergindo num rio de azeite celeste. Paulatinamente, dos artelhos ao último fio de cabelo, era inundado pelo dúlcido amor de Jesus Cristo. Ao contrário do marulho espiritual que estava ao derredor, nada ouvia. Um ensurdecedor silêncio me cercava, como se tudo estivesse preso a um rio de cristal. Apenas chorava e exaltava ao Senhor em glossolalia ininterrupta.
Depois desta experiência pentecostal, desejei ardentemente ler a Bíblia e dedicar-me à evangelização. Evangelizei meus colegas e professoras do colégio, levando alguns deles a Cristo. Comecei a pregar nos cultos de oração, de crianças e a dar testemunhos em alguns cultos. Desta fase, lembro-me apenas de que, numa das ocasiões em que estava pregando, um obreiro, após a pregação, pediu para contar uma revelação. Disse ele que, enquanto eu falava, estava ao meu lado um anjo da parte do Senhor com um rolo nas mãos. E todas as minhas palavras correspondiam às palavras daquele livro. Naquele momento, apesar da idade pueril, tive certeza de minha vocação ao ministério da Palavra. Amava a Cristo, aos meus pastores, a igreja de nosso Senhor Jesus e, a Escola Dominical. Usava uma das Bíblias de minha querida avó, de capa vermelha, de conservação mediana, mas aguçada.
Nos fins do inverno de 1979, recebi de minha professora da Escola Dominical, irmã Lúcia, a incumbência de ler o Texto Áureo da Lição 9, de 26 de agosto de 1979, Carta à Igreja de Sardo, da revista Amigos de Jesus. Foi o meu primeiro versículo bíblico: 1 João 5.11 - "E o testemunho é este: que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está em seu Filho". Retive o texto na memória e, no domingo da Lição, o declamei. Lembro-me que essas palavras destilavam como mel em meus lábios. Memorizar o texto era como brincadeira de pirata; escondia cada palavra no recôndito de meu coração como se cada uma fosse um tesouro somente meu.
Quanto ao meu interesse infantil pela educação, quase não há registros em minha memória para uma mimese, embora ouça aqui e acolá alguns amigos descrevendo desde novo seus primeiros rabiscos numa lousa, como se estivessem ministrando aulas régias para alunos imaginários. Minha única preocupação era aprender a Palavra de Deus, a qual amava e ainda amo. Lembro-me apenas da história do personagem que emprestou-me o nome e da avidez antropofágica pela leitura, principalmente da Bíblia, movido principalmente pelo relato a respeito do sacerdote Esdras. Li toda a Bíblia no ano de 1979. À maneira de Rudolf Otto, o numinoso sempre acompanhou meu interesse pedagógico que, antes de tudo, era mais teológico do que humanístico.
Segui a mesma fé de minha mãe e avó e, na igreja, ainda adolescente, fui despertado por uma missionária, a doce Eva Maria, a tornar-me um professor na Escola Dominical. Dei as minhas primeiras aulas de educação cristã após o meu batismo, aos quinze anos, sob a orientação desta vestal, que na época era estudante do curso de Pedagogia. Identifiquei-me profundamente com o múnus docente, entretanto, necessitava de capacitação. Matriculei-me aos dezessete anos em um curso básico em Teologia, após a conclusão fiz o nível Médio, e logo depois, o bacharelado. Ao matricular-me no bacharelado em Teologia estava escrito nas linhas-mestras de minha existência que eu escolheria a Pedagogia como ciência afim.
Isto ocorreu no verão de 1990. Cerca de cem acadêmicos reuniam-se para receberem as aulas magnas dos mestres em Teologia. Durante a primeira semana, desfilaram impávidos esses senhores. Para uns, o sol crepuscular já declinava; para outros, já começara nevar no topo. Porém, surge na aurora de nossa classe um sol nascente que irradiava calor e vivacidade. Era o professor de Didática e Pedagogia. Esse educador trazia nos olhos o brilho que difundia paixão pela educação; e, na alma, o ritmo pedagógico que pulsava análogo ao seu coração. Era um inovador em sala de aula, um transgressor da monotonia e da rotina.
Enquanto muitos, com suas aulas régias, cercavam-se pela experiência e tradição, fincados distantes em seus pedestais, o professor Marcos Tuler ensinava com olhares, toques, cheiros, sabores e calor. Ainda hoje, em sua aula inaugural, recordo-me da memorável frase: “Pedagogia não é apenas útil ao contexto da sala de aula, mas à vida”. Essas palavras abriram profundas feridas em minha vida que, ainda hoje, teimam em cicatrizar; latejam veementes entre o ser e o querer, o já e o ainda não. Algum tempo depois, quando matriculei-me no curso de Pedagogia na Associação Catarinense de Ensino (ACE) em Joinville, SC, enviei ao mestre Tuler um e-mail, agradecendo-lhe pelo sulco incurável que eu carrego. E, de fato, passados mais de uma década, aquelas palavras mostraram-se oportunas e verdadeiras. E, seguindo a canção entoada pela sinfonia da vida ministerial procuro guardar a mesma fé, firmeza, e amor dos meus tempos de menino.

TEOLOGIA & GRAÇA: TEOLOGANDO COM VOCÊ!



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