Theología, segundo o étimo helênico, é a ciência que estuda sobre Deus e todos os assuntos pertinentes à fé e à religião. O Theólogo é tanto o que fala a Palavra de Deus quanto aquele a quem Deus fala. A fé, do ponto de vista da theologia, é axioma indispensável à compreensão do Inefável.
domingo, 30 de setembro de 2012
Teologia: Uma Leitura Antropológica
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
FIDES ET RATIO - Fé e Razão

Fides et Ratio: Exigências e tarefas atuais. São Paulo: Edições Loyola, 1999, p.61-74.
Fides et Ratio trata da relação entre fé e razão e mais especificamente entre teologia e filosofia. Composta por sete capítulos[1], a Encíclica trata no último a respeito das Exigências e Tarefas Atuais da palavra de Deus (80-91) e da teologia (92-99). De modo geral, o documento expressa a importância do labor teológico e da investigação filosófica à compreensão do binômio fé e razão e da presença do homem no mundo.
1. A primeira seção do capítulo em epígrafe (80-91) apresenta uma síntese da perspectiva filosófica da Sagrada Escritura a respeito do homem e do mundo que, em Jesus Cristo, caminham para sua plenitude. Todavia, insurge sobre esse evento alguns percalços atuais. Dentre eles, a crise de sentido provocado pelo fenômeno da fragmentação do saber, cuja pluralidade de respostas procedentes das mais variegadas teorias agrava ainda mais a dúvida a respeito do sentido e contribui para o aumento do ceticismo e da indiferença do homem em relação à fé.
Diante deste quadro, o homem fecha-se ao transcendente dentro dos limites da própria imanência. É necessário, portanto, que a filosofia volte a encontrar a sua dimensão sapiencial, que se constitui na unificação do saber e do agir humano, a fim de que ambos sejam convergidos para um fim e sentido definitivos, que se encontram na religiosidade constitutiva de cada pessoa.
A segunda exigência que se faz à filosofia é verificar a capacidade de o homem chegar ao conhecimento da verdade, fato este que a Sagrada Escritura pressupõe apesar das mazelas humanas.
A terceira exigência refere-se ao retorno da filosofia à metafísica, isto é, que ela seja capaz de transcender os dados empíricos, sensíveis e fenomenológicos para chegar, na sua busca da verdade, a algo absoluto, definitivo e básico, cujo fundamento último é o próprio Deus. A urgência da instância metafísica ainda é mais evidente diante das ciências hermenêuticas e da análise linguística, pelo fato de alguns especialistas não se ocuparem em descobrir a essência da realidade, mas limitar-se apenas a exprimi-la e compreendê-la, aumentando assim a crise de confiança acerca da capacidade da razão.
A fé e a filosofia, portanto, devem prevenir-se contra os erros e desvios de alguns “ismos” filosóficos: ecletismo, historicismo, cientificismo, pragmatismo e niilismo. O primeiro pelo fato de unir ideias e concepções heterogêneas fora de seu contexto histórico. O segundo por negar o estado perene da verdade por compreendê-la e limitá-la a determinado período histórico. O terceiro por desconsiderar outras formas válidas de conhecimento e reduzir à razão tecnicista. O quarto por sua visão unidimensional e utilitarista do ser humano. O quinto, niilismo, que julgo ser dentre os demais ismos aquele que mais esvazia o homem e o mundo de sentido e se constitui um desafio para a fé cristã. Primeiramente, pelo fato de o niilismo atingir diversas áreas da vida humana. Segundo, o niilismo de matiz nietzschiano não apenas afirma a falta de sentido das coisas, mas encoraja ao ser a não procurá-lo. Ele proclama a morte do sentido. Na filosofia niilista resta ao homem o vazio, a desilusão em não encontrar um propósito, um sentido para a vida. Não existe, portanto, qualquer valor ou conceito de verdade, mas a falta deles. O homem está só. O mundo não avança em direção a um telos. O niilismo rejeita toda a verdade objetiva e lança o homem em um vazio, desespero e solidão. Na filosofia niilista não apenas as representações de Deus estão mortas, mas o próprio Deus.
2. A segunda seção do capítulo em análise trata das tarefas atuais da teologia, com destaque à renovação da metodologia teológica, tendo em vista um serviço mais eficaz à evangelização, a adequação da doutrina às exigências de nosso tempo, resguardando, contudo, seus aspectos fundantes, e a necessidade de se manter o olhar fixo sobre a verdade última confiada por meio da Revelação. Por conseguinte, o propósito fundamental que a teologia persegue é apresentar a compreensão da Revelação e o conteúdo da fé.
Todavia, surge a questão problemática entre o significado e a verdade, pelo fato de o teólogo laborar com a compreensão do mistério, que tem que ser individuado e exposto. Por conseguinte, a linguagem de Deus toma corpo na linguagem humana. A Revelação comunicada é mediatizada primeiramente pelas fontes que a descreveu na Escritura, transmitindo a verdade sobre o próprio Deus e refletindo a lógica da Encarnação. Por essa razão o teólogo deve se interrogar sobre qual seja a verdade profunda e genuína que os textos da Sagrada Escritura querem comunicar, muito embora esteja no invólucro e limite da linguagem.
Por tratar do mistério de Deus exige-se do hermeneuta a elaboração do intellectus fidei ligada à filosofia do ser. A teologia não pode estar dissociada da fé ao mesmo tempo em que precisa estar ligada a uma boa filosofia para explicitar o significado. A fé é conditio sine qua non para se compreender o mistério! É, portanto, necessário conciliar o caráter absoluto e universal da verdade com o inevitável condicionamento histórico e cultural das fórmulas que as exprimem.
Assim, portanto, a reflexão filosófica pode contribuir para esclarecer a relação entre verdade e vida, entre acontecimento e verdade doutrinal, e, sobretudo, a relação entre verdade transcendente e linguagem humana inteligível.
Esdras Costa Bentho
terça-feira, 4 de setembro de 2012
Uma Era Secular

TAYLOR, Charles. Uma Era Secular. São Leopoldo: Unisinos, 2010, p.13-37
Charles Taylor inicia a obra em epígrafe interrogando a respeito do significado de se viver “numa Era Secular”. O que significa viver em uma Era Secular para aqueles que vivem no mundo do Atlântico Norte?
O autor inicialmente restringe sua análise a essa área geográfica, mas especificamente à “cristandade latina”, mas compreende que a secularidade seja um fenômeno que se estende de maneira diferente e parcial para além do norte do Ocidente. Os países islâmicos, a Índia e a África não são classificados como “secularizados”, na perspectiva do teórico. A modernidade, diz o autor, promove a secularidade em três formas distintas, mas inter-relacionadas.
Taylor apresenta três pistas teóricas para distinguir e definir o sentido do termo secularidade. Das três opções, opta pela última, as condições da fé ou crença.
1. A religião como questão privada e sua ausência nos espaços públicos. As sociedades pré-modernas estavam embasadas em certos fundamentos sagrados e organizadas sob a perspectiva da religião. A vida nessas sociedades e a organização do Estado apontavam para o transcendente. Com a autonomia dos estados ocidentais não há mais essa conectividade e dependência da cosmovisão anterior. A religião, portanto, torna-se uma questão privada e de caráter particular na Modernidade. Mais especificamente na Europa, é possível envolver-se em diversas áreas da vida pública e nem sequer ouvir ou reconhecer o sagrado como necessário à manutenção da vida e dos valores morais. Esta mudança acena para a mudança de um paradigma cultural fundamentado no sagrado para um novo paradigma cultural de base secular. Neste aspecto, a primeira via para entender o atual contexto de secularidade da sociedade diz respeito ao esvaziamento da religião nas esferas sociais autônomas, às vezes impostas por um regime totalitário, como no caso da Polônia, às vezes em regime democrático que faz a completa separação entre o Estado e a Igreja, mas não elimina a manifestação do sagrado, como os EUA.
2. Abandono de convicções e práticas religiosas. Essa segunda via para se compreender o conceito de secularidade refere-se ao fato de pessoas abandonarem suas convicções e práticas religiosas, afastando-se de Deus e deixando de frequentar a igreja. Neste aspecto, os países da Europa ocidental se tornaram seculares, mesmo aqueles que mantêm alguma referência do sagrado nos espaços públicos. Especificamente aqui, a secularidade é compreendida como declínio da fé cristã e a substituição desta por outros tipos de crenças, como a crença na ciência e na razão, ou até mesmo na emancipação de certas ciências como a teoria da evolução. Taylor, todavia, não se satisfaz com essa forma de explicação pelo fato de não estar convicto de que as descobertas darwinianas refutam a religião ou que as pessoas abandonam a fé por causa da teoria evolucionária.
3. As condições da fé. Para que a sociedade chegasse a esse terceiro nível de secularização, Taylor afirma que foi implicitamente necessário que houvesse o esvaziamento da religião no espaço público. Embora essa terceira via esteja relacionada às anteriores, Taylor a nomeia como pilar fundamental para se compreender adequadamente o sentido que ele explicita e defende de Era Secular. A secularidade, portanto, consiste na passagem de uma sociedade em que a fé em Deus é inquestionável para uma na qual a fé torna-se mais uma opção entre outras e, em geral, não a mais fácil de ser abraçada. A fé cristã não é a única a disputar pelo interesse e adesão das pessoas, mas divide o espaço público com outras crenças e saberes religiosos opostos.
A fé cristã, por conseguinte, é mais uma no panteão das crenças e dos deuses modernos. Evidentemente, esse fator procede das mudanças culturais e sociais de nossa contemporaneidade, principalmente do pluralismo e multiculturalismo. Há, por conseguinte, uma passagem de uma condição de existência “ingênua” para outra realidade na qual a opção religiosa do indivíduo é uma entre muitas outras. O crédulo logo se dá conta de que é “engajado” a um ponto de vista que expressa melhor suas convicções, mas ao mesmo tempo é “desengajado” pelo fato de ocupar um ponto de vista entre uma gama de perspectivas possíveis.
O que torna possível esse reconhecimento ou mudança é a ruptura com o background, ou pano de fundo que sustentava anteriormente uma perspectiva “ingênua” e possibilita a substituição dela por uma estrutura “reflexiva”. A passagem de uma para outra só foi possível pela mudança de background, isto é, de todo o contexto que sustentava e sustenta cada uma das duas perspectivas. Assim, a fé em Deus, como afirma o autor, não é mais axiomática; e crer em Deus hoje não é mais como em 1500 ou 2000. O autor nesse ponto se interroga acerca da razão pela qual a sociedade passou de uma condição na qual as pessoas viviam ingenuamente por meio de uma cosmovisão teísta, para outra na qual a descrença tornou-se a principal opção padrão. Isto significa interrogar-se acerca do desaparecimento da estrutura “ingênua” e o surgimento da estrutura “reflexiva”.
Segundo Taylor, foi a chegada do humanismo exclusivo como uma opção disponível que possibilitou toda essa nova condição. Esse humanismo é antropocêntrico e se define como a medida de todas as coisas, parafraseando Pitágoras. Trata-se de uma perspectiva da vida que se concentra na capacidade do homem em construir para si um mundo livre e autônomo de Deus ou do sagrado como explicação da existência. Essa perspectiva que se desdobra ainda mais entre os filósofos da suspeita reafirma, se não a “morte de Deus, seu completo banimento do mundo.
Conclusão
Entre as contribuições mais significativas do autor está o conceito de secularidade como um processo ad intra em vez de ad extra em relação à religião. Até então alguns autores trataram da secularidade como exterior e mesmo contraposto à religião, Taylor, entretanto, a situa como um processo intra-religioso. Isto significa afirmar que a intensidade da secularidade está intrinsecamente relacionada à intensidade com que a religião se manifesta na sociedade. Para Taylor, portanto, a secularidade consiste em novas condições de crença; em uma nova feição da experiência que incita a crença e é definida por ela, em um novo contexto no qual toda busca e todo questionamento acerca do moral e do espiritual devem ser conduzidos. Haveria lugar ainda para se destacar alguns conceitos caros para o teórico, como por exemplo: “contexto de compreensão”; “plenitude”; “religião”, além de analisar a questão fenomenológica no escrito.
Esdras Costa Bentho