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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Jogos e Brincadeiras nos Tempos Bíblicos: três perguntas


  • Recentemente fui entrevistado pela Revista JC, publicação denominacional das Assembléias de Deus no Brasil, dirigida aos jovens cristãos, a respeito dos jogos e brincadeiras nos tempos bíblicos. Pelo caráter e conteúdo histórico-cultural estou reproduzindo a entrevista que, embora não tenha sido publicada na íntegra pelo periódico, segue aqui com todos os termos.

1) Como era o lazer naquela época? Havia muitas opções? Era considerado algo desnecessário ou importante na cultura hebraica? E em outras culturas?

R.: Inicialmente, precisamos descrever que as Sagradas Escrituras não se ocupam do tema em apreço. Quando o salmista emprega o termo shā'a, isto é, "recrear", "deleitar" ou "brincar" no Salmo 119.16, o faz em sentido litúrgico ou teologal. A concepção greco-romana de "lazer", "brincar", "esporte" ou "jogar" ou mesmo da antropologia filosófica que trata do homo ludens (homem lúdico) é basicamente inexistente dentro do ambiente judaico-cristão primitivo. Geralmente, o lúdico ou esportivo era empregado como uma metáfora das verdades espirituais. 1 Coríntios 9.24, por exemplo, é uma prova contundente do que estamos afirmando.

A labuta diária do judeu no Antigo Testamento não o permitia inclinar-se a tal divertimento ou passatempo, sendo o sábado, um dia de repouso e, as festas religiosas, uma ocasião de estímulo e adoração. Isto não quer dizer que os hebreus desconheciam brincadeiras, parlendas ou jogos. Os jogos e a busca de lazer eram basicamente ocupados pelas atividades e festas religiosas.

Engana-se quem pensa que o judeu comum era triste, cabisbaixo. Pelo contrário, era alegre, divertidíssimo. A música e a dança constituíam-se elementos culturais fortíssimos entre os hebreus do AT. No entanto, no período interbíblico alguns judeus helenistas, obedecendo a Antíoco Epífanes, introduziram em Jerusalém uma praça de esporte, ato considerado pagão pelos patrícios mais conservadores. Como é perceptível, os judeus da Antiguidade davam pouco valor aos jogos (jocus, gracejo, graça, zombar), e não se ocupavam com o lúdico (ludus, divertimento, passatempo). Considere que a palavra "brincar", no hebraico, śāchaq, tem um sentido positivo (brincar, divertir-se) e negativo (zombar, rir com deboche, ridicularizar).

O amor aos jogos, esportes e ao lúdico era considerado um ato vulgar ou irreligioso para o hebreu. As crianças não eram proibidas de brincar e desenvolver seus jogos particulares, mas deveriam tomar todo cuidado para que as brincadeiras não fossem irreverentes, sacrílegas, ou que ofendessem a moral ou a santidade divina (Lv 24.11,16). Os hebreus costumavam evitar certos gracejos maliciosos. Mas é possível que os hebreus de família abastada desfrutassem de certos jogos, como o arco e flecha, a caça entre outros e, que as atividades, como o treinamento militar, também incluíssem nos intervalos jogos ou brincadeiras correlatas.

Já entre os outros povos do Oriente Próximo, os esportes e jogos eram mais freqüentes. Diversas iconografias atestam que o jogo de damas, de dados, o malabarismo com bolas, e até mesmo jogos de azar eram muito freqüentes entre os egípcios e os povos mesopotâmicos.

2) Quais as formas de diversões para jovens, adultos e crianças?

R.: Os jogos infantis não eram tão diferentes daqueles que as crianças ainda hoje continuam a jogar e brincar. Muitos jogos e brincadeiras infantis eram reflexos daqueles praticados pelos adultos. A rua era um espaço para a brincadeira e mimetização dos adultos.

O profeta Zacarias (8.5), referindo-se às bênçãos futuras de Israel, afirma que "as ruas se encherão de meninos e meninas, que nelas brincarão". Isto indica que durante certo período o brincar nas ruas era muito perigoso em função das constantes guerras, transferindo esse espaço do brincar para dentro das casas. Mas, em dias de paz, as brincadeiras e jogos eram praticados nas ruas.

O próprio Jesus faz referência às brincadeiras infantis nas ruas e praças (Mt 11.16,17). Segundo o texto mateano, as crianças brincavam de "tocar flauta", "danças" e, transgressoras como são do mundo dos adultos, imitavam as carpideiras que choramingavam nos velórios. Você já imaginou um grupo de crianças mimetizando essas profissionais do pranto? Com certeza era muito hilário. As crianças costumavam brincar com os animais (Jó 41.5), bolas de gude, uma forma de amarelinha, assobios, chocalhos feitos de cerâmica e pedrinhas, jogos de tabuleiro também eram muito freqüentes. Um desses jogos, conhecido como Jogo Real de Ur, data de 1800 aC. Os jogos como os mancalas (jogos de tabuleiro), muito conhecidos na África, estavam presentes no cotidiano das crianças hebréias.

A vida dos jovens e adultos também refletia a realidade e o contexto em que viviam. As festas sabáticas, os cânticos, as músicas e as danças, arco e flecha, propor enigmas e jogos de prendas eram os tipos de diversões mais comuns entre eles. Em o Novo Testamento, Mateus 27.27-31, menciona um jogo muito conhecido entre os adultos, o "Basileu". Neste jogo, o pino de madeira que o jogador usava para movimentar-se nas linhas marcadas no chão, foi substituído pelo próprio Senhor! Ainda hoje temos registros desses jogos em Jerusalém.

3) Havia brincadeiras que não eram permitidas ao povo de Deus por serem consideradas profanas ou mesmo por terem origem em outros povos? (até um tempo atrás algumas formas de diversão eram proibidas por nossa própria denominação e até hoje são tabus com jogar bola e certos tipos de jogos em tabuleiros, assistir televisão... Naquela época também havia restrições deste tipo?)

R.: Havia sim. As brincadeiras com bonecos e bonecas não eram freqüentes ou permitidos entre os judeus. Embora muito comum entre os egípcios, canaanitas e mesopotâmicos, o hebreu procurava evitar, em função do mandamento de Êx 20.4, essas representações.

A idolatria era tão comum entre os povos antigos que, às vezes, os historiadores e arqueólogos têm dificuldade em afirmar quando se trata de um brinquedo ou um ídolo para adoração. Todo e qualquer brinquedo esculpido era proibido entre os hebreus. Brinquedos que continham em seu bojo o elemento divinatório também eram proibidos pelos judeus. Brincar de adivinhação, fazer gracejos com coisas sagradas eram terminantemente proibidos. Outro brinquedo não muito utilizável entre os hebreus dos tempos bíblicos, era o dado ou congênere. Embora os arqueólogos tenham encontrado no território judeu alguns dados, isso não significa que eles eram usados com freqüência nos jogos profanos, uma vez que possuía certo caráter sagrado.

A imagem que ilustra este tema não representa os templos bíblicos.

9 comentários:

daladier.blogspot.com disse...

Muito boa a abordagem deste assunto tabu. Lembro que há alguns anos atrás os crentes não podiam sequer sorrir. Se alguém sorrisse muito era tido como mundano. Infelizmente a cosmovisão de uma pessoa influi sobre o comportamento denominacional. Na EBO/2008 aqui em Abreu e Lima, um pastor convidado, de renome nacional, disse que não concordava que um obreiro usasse jeans!

Victor Leonardo Barbosa disse...

Muito boa essa entrevista pastor Esdras, eu me lembro de tê-la lido na Geração JC. Serviu de muito auxilio para uma melhor compreensão do mundo hebraico. Que bom que o senhor a republicou, pude lê-la novamente e aprender mais.

Um grande abraço e Paz do Senhor!!!

Carlos Roberto, Pr. disse...

Caro Pr. Esdras Bento!
Parabéns pela excelente entrevista concedida.
Seu conteúdo, além de trazer relevantes conceitos culturais dos tempos bíblicos, permite o desenvolvimento de uma consciência que avalie o que é certo ou errado, sem no entanto ser determinante ou limitada ao conceito de proibido e liberado.
Parabéns!
Pr. Carlos Roberto

Anônimo disse...

muito edificante pastor,gostei muito das respostas culturais,Deus abençoe grandemente.Paz de Cristo

Anônimo disse...

A paz do Senhor Pr. Esdras muito interessante Abordar este assunto, pois os pais evangelicos, precisam ensinar aos seus filhoscomo brincar.E até mesmo o que deve ou não assistir nos programas de televisão

Esdras Costa Bentho disse...

Kharis kai eirene

Prezado Daladier, sua observação é veraz. Nós, que estamos desde crianças na igreja, sabemos dessas verdades!
Um abraço
Esdras Bentho

Unknown disse...

Parabens pela materia Pastor Esdras. Que Deus continue revelando mais do povo de Israel para que voce continue contribuindo com esses conhecimentos. Forte abraço.

Unknown disse...

Muito boa essa materia! Parabéns, professor! Obrigada por compartilhar!

Unknown disse...

Parabéns pastor Esdras.
Quem não tem esse conhecimento pensa que o povo de Israel vivia aborrecido e sem alegria.
E a abordagem do pastor revelou que eles eram mais alegres que nós.
Hoje em dia dámos tudo aos nossos filhos sem saber dos perigos e dos princípios bíblicos para a educação dos deles.
Obrigado pastor que Deus ricamente possa te abençoar.

TEOLOGIA & GRAÇA: TEOLOGANDO COM VOCÊ!



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