DÁ INSTRUÇÃO AO SÁBIO, E ELE SE FARÁ MAIS SÁBIO AINDA; ENSINA AO JUSTO, E ELE CRESCERÁ EM PRUDÊNCIA. NÃO REPREENDAS O ESCARNECEDOR, PARA QUE TE NÃO ABORREÇA; REPREENDE O SÁBIO, E ELE TE AMARÁ. (Pv 9.8,9)

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Ensaio à Prolação do Grego Neotestamentário



A prolação do grego bíblico

Uma das grandes contribuições da Renascença européia à cultura ocidental foi o interesse pela literatura clássica da Grécia e Roma. A filosofia e cultura heleno-latina foram estudadas copiosamente pelos artistas e filósofos humanistas. A concepção religiosa de Jerusalém cede lugar à cosmovisão secular inspirada nas ruas de Atenas e Roma. Era uma época de paradoxos para o cristianismo, pois ao mesmo tempo em que o humanismo provocava o distanciamento dos estudos teológicos, aproximava os estudiosos da pesquisa dos manuscritos gregos do Novo Testamento. O latim passa a ser substituído por línguas vernáculas nacionais e abandona-se a Vulgata Latina para a leitura dos manuscritos gregos.


Nesse período, dois humanistas cristãos se destacaram: o holandês Desidério Erasmo (1467-1536) e o alemão Johann Reuchlin (1455-1522), preceptor de Philipp Melanchthon. O primeiro foi o responsável pela elaboração e organização do Novo Testamento grego conhecido como Textus Receptus, usado por Lutero e João Ferreira de Almeida. O segundo, dedicou-se também ao estudo do grego e do hebraico, elaborando tratados que auxiliassem o estudante devoto nas línguas originais.


Pronúncia erasmiana. Porém cada um dos humanistas defendia uma leitura do grego diferente. Reuchlin aprendera o grego com professores nativos e defendera a leitura da koinē neotestamentária em idioma moderno. Erasmo, entretanto, por meio do estudo comparativo dos manuscritos, erros dos copistas entre outros instrumentos lingüísticos, propôs uma outra pronúncia do grego koinē. A prolação "erasmiana", como ficou conhecida, respeitava a pronúncia individual das vogas breves e longas, e o valor sonoro distinto de cada signo do alfabeto grego. A ortoépia ensinada por Erasmo também foi chamada de etacismo pelo fato de pronunciar o ēta (ē) diferentemente do iōta (i).


Pronúncia iotacista. Todavia, a prosódia do grego ensinada por Reuchlin seguia as mesmas regras do grego moderno, assim como os helenos hodiernos continuam a fazê-lo. A de Erasmo, no entanto, percorria caminhos diferentes, de acordo com as pesquisas do humanista holandês. A pronúncia transmitida por Reuchlin, chamada de iotacismo, por identificar a vogal longa ēta (ē) com o iōta (i), fora ensinada pelo erudito Manuel Crisolvas em Florença. O iotacismo foi difundido na Alemanha através da gramática grega elaborada por Melanchthon, sobrinho de Reuchlin.


Críticas. Porém, o juízo crítico pede ao estudante do grego neotestamentário para que julgue os fatos e não dogmatize entre uma pronúncia e outra. Por meio da crítica textual, descobriu-se o fragmento de um manuscrito antigo, atribuído ao cômico Aristófanes, que grafa o balido da ovelha como: "βη... βη... βη". Seguindo a ortoépia sugerida por Reuchlin e do grego moderno, o balido da ovelha seria "vi...vi...vi", enquanto, na erasmiana "bē...bē...bē". De acordo com os helenistas modernos, o grego seja clássico seja koinē, jamais foi pronunciado como os dois humanistas pretenderam. No Brasil, os seminários e faculdades teológicas em sua maioria ensinam à pronúncia erasmiana, pronúncia também seguida pelo manual de introdução ao grego neotestamentário que estou elaborando, já em fase de conclusão.


Contudo, na Europa, principalmente na França, os helenistas e lingüistas já ensinam a "pronúncia reconstruída" – uma tentativa de aproximar-se da prosódia e ortoépia do grego antigo. Já o gramático espanhol e professor de grego bíblico, A. Septién, em sua opus magna, Grego Bíblico ao Alcance de Todos, ensina a prolação do grego neotestamentário conforme a pronúncia moderna. Provavelmente ainda ocorram muitos avanços e retrocessos no estudo do grego clássico ou bíblico.



terça-feira, 21 de outubro de 2008

História e seus Pressupostos

Angelus Novus - Paul Klee

História. O termo história, procede do grego histōr cujo significado literal é “instruído”; “aquele que sabe”; “juiz”. O histōr, como chamavam os gregos, era um sábio ou mestre que compartilhava o seu saber sobre o passado com outros. O conteúdo ministrado era conhecido como histōria. Desde então, o termo história tem sido definido ambiguamente como “registros do passado” ou “o estudo dos acontecimentos que se passaram”. Segundo Borges, o termo se refere aos “acontecimentos históricos” (a história-acontecimento) que são objetos de análises do conhecimento histórico (da história-conhecimento).[1] História, portanto, é tanto a descrição dos eventos passados quanto o estudo desses mesmos eventos.

Revolução Francesa. Mas, de acordo com Reis, somente após a Revolução Francesa, a história foi redescoberta “seja como produção do futuro, seja como reconstrução do passado”.[2] Nesta acepção, história não se limita a reconstituição do passado, mas a produção do futuro. De um lado temos os historiadores que vêem a história como uma reconstituição fiel do passado e fidelidade à tradição, enquanto de outro, os filósofos, que a viam como uma ruptura com o passado e uma construção do futuro. No entanto, o sentido histórico, “deveria articular conhecimento do passado e produção do futuro, sem romper estas duas dimensões”.[3] Assim sendo, só a história explica qualquer fenômeno humano – fora dela ou do exterior dela, nada que lhe é interior pode ser explicado.[4] Portanto, passado, presente e futuro não são elementos contraditórios, mas interdependentes. A história do presente é uma indagação feita pelo historiador concernente aos problemas contemporâneos. É preciso conhecer o presente e, em história, o fazemos, sobretudo, através do passado, remoto ou próximo. A história e o futuro, são elementos especulativos sob o ponto de vista humano, em que se discutem as tendências e probabilidades e não suas certezas.

Heródoto. Atribui-se ao grego Heródoto, considerado por alguns como o “pai da história”, o emprego do vocábulo para designar o estudo ou a investigação do passado. Todavia, em nossa abordagem, “história”, além de possuir o significado acima expendido, restringe-se ao desenvolvimento e transformações históricas nas quais o próprio Deus intervém. E, a transformação, como afirma Borges, “é a essência da história”.[5]

Historicismo Religioso

O termo historicismo foi empregado por Karl Werner, em 1881[6], na obra Giambatista Vico como Filósofo e Pesquisador Erudito, a fim de se referir às principais correntes de pensamento que evidenciavam a estrutura histórica da realidade humana. Entre essas escolas destacavam-se as teorias dialética, hegeliana e religiosa. A primeira é descrita como a história da matéria, do trabalho e da técnica humana. A segunda, da manifestação do Absoluto. Filósofos e historiadores como Wilhelm Dilthey, Karl Mannheim e Arnold Toynbee compreenderam a história como a “essência da condição humana”. O homem, como todos sabemos, é um ser finito, temporal e histórico; é o agente humano que faz a história. A terceira corrente, historicismo religioso, foco de nossa análise, refere-se à história enquanto conhecimento, relato, ou transcrição dos fatos, mas não se limita apenas a estes dados, mas a interpretá-los, apreender a sua significação.

Do ponto de vista cristão, história é o diálogo da graça divina e da liberdade humana, o processo ao longo do qual à vontade e o amor de Deus se manifestam não só na criação do mundo e do homem, mas na sua redenção, na encarnação do Verbo divino, na vida, morte e ressurreição de Cristo e sua vinda, revelada e visível. Portanto, a história visível, concreta, revela o plano divino, os desígnios da santa providência – história e meta-história.

A História como Disciplina Teológica

A História como disciplina auxiliar da Teologia, tem sido amplamente inserida nos currículos das Faculdades e Seminários evangélicos em função de sua relevância à compreensão das ciências bíblicas. Essa realidade e metodologia não são estranhas ao contexto acadêmico, muito menos à História de Israel no Antigo Testamento deve ser considerada uma pseudociência por ser tratada fora de seu macro conjunto. Assim como se estuda a História do Direito, da Educação e da Filosofia, sem a pretensão de afirmar que essas abordagens sejam contrárias à História Universal, a História de Israel ou Bíblica é uma contribuição às Ciências do espírito ou ciências histórico-sociais (Geisteswissenschaften). Assim também estudamos:

a) História de Israel no Antigo Testamento;
b) História da Igreja;
c) História das Missões;
d) História da Teologia.

Portanto, ao estudarmos a história de Israel e os costumes religiosos judaicos, reconhecemos que o desenvolvimento de cada sociedade é único, singular, cujas alterações são próprias da ação dos próprios indivíduos, sujeitos e agentes da história, excetuando-se, logicamente, a meta-história. Mesmo que alguns autores neguem a existência de “uma força superior”, externa aos homens, que dirija a história, cremos na providência divina na história de seu povo.

Concepções da História

1. Concepção positivista: Considera a história como uma sucessão de fatos ordenados, de acontecimentos retilíneos, em direção a maturidade da humanidade, ao seu ápice, ao seu progresso, que será atingido quando a humanidade alcançar o estado perfeito ou absoluto. Este estado segundo Chauí é "caracterizado pela renúncia do conhecimento absoluto, das causas últimas, passando então a dirigir as forças intelectuais para a compreensão das leis e das relações que se podem constatar entre os fenômenos por meio da observação e dos instrumentos teóricos." [7]

2. Concepção marxista: Rompeu com a concepção anterior e colocou o centro da história no homem e o cerne da ciência na história.[8] Para Marx e Engels todo homem precisa estar em condições de viver e poder “fazer história”. Para eles o primeiro ato histórico é engendrar os meios para a satisfação das necessidades humanas, como beber, alimentar-se, vestir e morar.[9] Para esses dois pensadores a história é intrinsecamente sociológica, determinada por fatores econômicos. [10]Uma vez que essas necessidades sejam satisfeitas, entra a terceira circunstância, a reprodução humana.

3. Concepção dos Annales. Esta concepção pode ser entendida nas palavras de Lucien Febvre, um de seus mais insignes representantes, que afirmou: "Para fazer história, virem resolutamente as costas ao passado e antes de mais vivam. Envolvam-se na vida."[11] Deve-se a essa concepção o “reconhecimento da ligação indissolúvel e necessária entre passado e presente no conhecimento histórico, reafirmando-se as responsabilidades sociais do historiador”.[12]

4. Concepção da História Nova. De certa forma segue a linha traçada dos Annales. No entanto, segundo Lopes, repousa sua novidade em três processos: novos problemas – põe causa a própria história; novas contribuições – enriquecem, transformam os setores tradicionais da história; novos objetos – aparecem no campo epistemológico da história.[13]

5. Concepção cristã. Esta concepção já ficou demonstrada ao longo do artigo, entretanto, merece um tratamento exclusivo. Infelizmente, já ultrapassamos o limite de caracteres, ideal para uma boa leitura na internet. A abordagem cristã contemporânea da história sempre esteve em busca do enlace e do divórcio. Haja vista as concepções de Oscar Culmann, Jürgen Moltmann, Paul Tilich entre outros. Atualmente, a Teologia Aberta trouxe novos confrontos ao entendimento da ação de Deus na história. Numa outra ocasião trataremos especificamente da abordagem cristã da história, trazendo, se possível for, uma nova perspectiva teologal do dispensacionalismo.


[1] BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. São Paulo: Brasiliense, 1993, p. 48.
[2]REIS, José Carlos. Wilhelm Dilthey e a autonomia das ciências histórico-sociais. Biblioteca Universitária. Londrina: Editora da Universidade Estadual de Londrina, 2003, p.1.
[3] Id.Ibid, p.2.
[4] Id.Ibid., p.11.
[5] Op.cit. p.50.
[6] E. Imaz, na obra El pensamiento de Dilthey: evolution y sistema, atribui a data de 1879 para o surgimento do emprego do termo historicismo, exclusivamente relacionado ao historicismo filosófico de Vico.
[7] CHAUÍ, Marilena (et al.). Primeira filosofia: lições introdutórias. 3.ed., São Paulo: Brasiliense, 1985, p.113.
[8] LOPES, Eliane Marta T. Perspectivas históricas da educação. 2.ed., São Paulo: Ática, 1989,p. 24.
[9] MARX. K.; ENGELS. F. A ideologia alemã. In: FERNANDES, F. (org.) Marx, Engels: História. São Paulo: Ática, 1983, p. 194 e 31.
[10] Id.Ibid.
[11] FEBVRE, Lucien. Combates pela história. Lisboa.Presença, 1977. v.I, p.56.
[12] LOPES, Op.cit., p;27
[13] Id.Ibidem.

domingo, 12 de outubro de 2008

O Superintendente e a Gestão da Escola Dominical



Superintendente


No Hebraico: O termo “superintendente” procede do latim e significa, “aquele que dirige na qualidade de chefe”; “aquele que inspeciona”, “aquele que supervisiona”. No hebraico, o paqîd é descrito como: inspetor, encarregado, capataz. O termo descreve um subordinado especial (Gn 41.34) posto em uma posição de “supervisão de outros”. O paqîd era um funcionário real de confiança que administrava o trabalho e funções dos soldados, sacerdotes e levitas no Antigo Testamento. Em 2 Cro 31.13; 34.10,12,17 é o administrador do Templo.


No Grego: O proistemi (Rm 12.8) é o que “preside”, literalmente “aquele que está à frente de”; “liderar” ou “dirigir”. De acorco com Paulo, os líderess são pessoas capacitadas sobrenaturalmente pelo Espírito Santo para administrar, presidir e liderar atividades executadas pelo Corpo de Cristo para o crescimento do Reino de Deus.


Contemporâneo: Se eventualmente admitirmos as atuais mudanças adminstrativas da educação brasileira na ED, chamaríamos a função do superintendente ou diretor de: “Gestor da Escola Dominical”. A mudança de nomenclatura envolve também uma alteração de rumo ou mudança política e administrativa dos antigos paradigmas ou modelos de organização escolar.


Funções Gestoras do Superintende da ED


1. Criar projetos de qualidade educacional (Projetos participativos)


2. Análise crítica do projeto educacional (Análise participativa)


3. Administrar os recursos humanos e materiais:


4. Selecionar com base na capacidade das pessoas de atenderem às especificações das atividades docentes;


5. Criar um ambiente de cooperação que promova a excelência e uma relação sólida e segura entre os professores e alunos, alunos e professores, superintendente e professor, professor e superintendente; superintendente e alunos, alunos e superintendente;


6. Envolver todos os professores e alunos na garantia da qualidade da Escola Dominical;


7. Criar programas de capacitação continuada para os professores;


8. Atender as necessidades materiais da Escola Dominical;


9. Atender os alunos:

  • Quem são os alunos?
  • Que necessidades eles têm?
  • Como melhor aprendem?
  • Como são estimulados à busca do conhecimento?
  • Como é a relação professor-aluno?
  • Qual o conteúdo ensinado?
  • Como respondem ao conteúdo ensinado?


10. Atender os professores:

  • Quem são os professores?
  • Que necessidades eles têm?
  • Como ensinam?
  • Como são estimulados à busca do conhecimento?
  • Como se relacionam com a igreja?
  • Qual a formação dos professores?
  • Como usam os recursos educacionais oferecidos?


Como Agem os Superintendes Eficazes?


1. Definem objetivos claros;


2. Exibem confiança e receptividade com relação aos outros;


3. Discutem fatos abertamente;


4. Solicitam e ouvem ativamente o ponto de vista dos outros;


5. Utilizam a gestão participativa para criar um abiente de cooperação e particiipação;


As Habilidades do Superintendente Eficaz


1. Habilidade de planejamento;


2. Habilidade de manejo e controle do orçamento;


3. Habilidade de organização;


4. Habilidade de resolver problemas criativamente;


Competências administrativas e pedagógicas

  • Habilidade de comunicar eficazmente;
  • Habilidade de mobilizar a equipe escolar e a igreja local;
  • Habilidade de desenvolver equipes;
  • Habilidade de negociar e resolver conflitos;
  • Habilidade de avaliar e dar feedback ao trabalho dos outros.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A Revelação e a Comunicação de Deus aos Homens


Definição da Doutrina

A doutrina da Comunicação de Deus aos homens é amplamente confirmada nas páginas das Sagradas Escrituras. Este ensino subordina-se a um outro: o da Revelação de Deus aos homens. A Doutrina da Revelação de Deus trata da manifestação que Deus faz de si mesmo e de sua vontade aos homens (Am 3.7).

Necessidade da doutrina

A doutrina da Revelação de Deus aos homens não é apenas necessária como também plausível. Dois fatores tornam essa doutrina indispensável: o implícito e explícito.

a) Implícito: O fator implícito diz respeito ao que Deus é em sua natureza incomunicável, transcendente, infinita, incapaz de ser conhecido pela razão, cognoscibilidade ou aferimentos humanos (Jo 1.18; 1 Tm 6.16). Em diversas perícopes as Sagradas Escrituras afirmam a incapacidade humana em conhecer a Deus em sua plenitude e glória: Ele habita em "luz inacessível" (1 Tm 6.16) e "nunca foi visto por alguém" (Êx 33.20; Jo 1.18).

b) Explícito: O fator explícito refere-se à natureza finita, temporal e vulnerável do homem. O cognoscível não é capaz de apreender o Incognoscível; o finito não compreende o Infinito; o mortal está aquém do Eterno: "Não sabes, não ouviste que o eterno Deus, o SENHOR, o Criador dos fins da terra, nem se cansa, nem se fatiga? Não se pode esquadrinhar o seu entendimento" (Is 40.28).

Definição de Revelação

a) Antigo Testamento. O hebraico bíblico possui diversas palavras que correspondem ao termo "revelação" na língua portuguesa. Contudo, o vocábulo gālâ, isto é, "descobri", "revelar", "tirar" é usado em sentido reflexivo com o significado de "desnudar-se" ou "revelar-se", como por exemplo, na revelação de Deus a Jacó (Gn 35.7). A Septuaginta (LXX) traduz o vocábulo na passagem citada por "epephánē", "manifestação", "aparição", ou "revelação" (epifania).

b) Novo Testamento. O grego neotestamentário emprega a palavra "apokalypsis" com o sentido de "revelar" ou "desvendar". Lucas (2.32), por exemplo, a emprega com a conotação de "tirar o véu", "revelar" – "phos eis apokalypsin". Em seu aspecto geral ou particular, revelação sempre estará atrelada aos conceitos de "manifestar", "tornar claro", "tirar o véu", "dar a conhecer" (Rm 16.25).

Por conseguinte, a doutrina da revelação de Deus nas Escrituras descreve a comunicação, revelação e manifestação sobrenaturais de Deus ao homem, revelando sua mensagem, propósitos e decretos.

Revelação e Teofanias

Teofania é um termo grego composto pelo substantivo "theós" e pelo verbo "phaneróō" que significa "revelar", "mostrar" ou "fazer conhecido". Teofania é o modo múltiplo, variegado, misterioso com que Deus se revela ou se manifesta ao homem. As teofanias são desdobramentos da revelação de Deus, de sua natureza, caráter e atributos de modo compreensível ao homem. As teofanias são:

a) visíveis (Gn 16.11,13; Êx 3.2-6; 19.18-20; Dn 7.9-14, etc), ou

b) audíveis (Gn 3.8; 1 Rs 19.12,13; Mt 3.17, etc).

Através dessas passagens percebemos que as teofanias, como veículos da revelação de Deus, podem ser:

a) humana (Gn 18.1,2,13,14),

b) angélica (Jz 2.1; 6.11,14), e

c) não humana (Gn 15.17; Êx 19.18-20).

Algumas dessas manifestações são, de acordo com muitos biblicistas, "cristofanias" (Jo 12.40,41).

Nas teofanias sempre é Deus quem toma a iniciativa de se auto-revelar. Essas manifestações são parciais, temporárias e não descrevem a completude da natureza divina. A única revelação permanente e completa do Pai foi realizada na Encarnação do Filho que, embora distinto do Pai, participa da mesma divindade (Jo 1.1,14-18).

Revelação Passiva e Ativa

A revelação de Deus deve ser entendida como o instrumento de imediata comunicação de Deus ao homem. Na revelação, Deus auxilia os homens a compreenderem Sua natureza e propósitos (Dt 4.29; Jr 33.3). As Escrituras demonstram vários níveis dessa comunicação, seja particular seja coletiva (Gn 2.16; 3.8,9; Gn 12.1; 15.1; 18.16; Êx 3.4; 19.3,9; 1 Sm 3.1; Is 6.1). Isto posto, a revelação proveniente e determinada por Deus é uma comunicação pessoal. O alvo final da revelação divina é que o homem venha conhecer a Deus de modo real e pessoal. Essa revelação manifesta-se bilateralmente:

Revelação ativa: É a revelação direta de Deus, enquanto Se dá a conhecer aos homens (Êx 3.1-6).

Revelação passiva: É o conhecimento de Deus que é passado de geração a geração (Dt 4.10).

A revelação passiva é o conhecimento de Deus que é comunicado aos homens através de um interlocutor, enquanto a ativa é a revelação direta de Deus ao homem, sem qualquer intermediário. Na passiva, Deus não se revela diretamente ao homem como o fez com Moisés, mas usa um intermediário (profeta, sacerdote, anjos, etc) para comunicar à sua mensagem aos seus servos.

No âmbito da revelação passiva é que encontramos a Revelação Geral de Deus (Gn 1; Sl 119; 148; Rm 1.20-23). Revelação Geral é o termo teológico que descreve uma forma de "teologia natural" (Sl 8; 19.1). Essa revelação acha-se impressa na criação. Apesar de não ser uma revelação pontifícia, como a Revelação Especial – o Logos Encarnado (Logos Theou) – e a Epistemológica (Rhema Theou), contudo, possui predicativos suficientes para que o homem conheça a Deus e o adore, bem como servirá de base para o julgamento dos ímpios (Rm 1.21-32; 2.1-8).

A Revelação Geral ocorre de duas formas distintas: uma revelação externa na criação, a qual proclama o poder, a sabedoria e a bondade de Deus e; a revelação interna da razão e da consciência em cada indivíduo (Rm 12.16; Jo 1.9).

A teologia cristã reconhece tanto a Revelação Geral quanto a Especial, como dois modos progressivos da auto-revelação de Deus. Porém, o ápice da revelação divina ocorre através do Verbo Vivo e da Palavra Escrita (Jo 1.1,14-18; 14.8,9; Hb 1.1-3). Estas revelações são os desvendamentos que Deus faz de si mesmo aos homens de modo imediato e sobrenatural. O Logos Encarnado revelou o Pai. A Palavra escrita registrou essa revelação e o seu progresso (Hb 1.1-3; 2 Pe 1.10,21; Gl 1.12). O propósito da revelação de Deus é que o ser humano o conheça, ame-o e o adore (Is 43.7; Sl 22.22; 149.6).

Proposições dogmáticas

a) As Escrituras pressupõem não apenas que Deus pode ser conhecido, mas que realmente é conhecido, porque Ele Se revela a Si mesmo;

b) O conhecimento de Deus revelado ao homem é justamente aquele que satisfaz a fome de natureza espiritual;

c) O conhecimento de Deus revelado resulta em adoração e obediência inteligente à Sua vontade;

d) Deus pode ser conhecido à medida que Se revela a Si mesmo ao se comunicar com os homens;

e) Através do conhecimento de Deus o homem fica habilitado a reconhecer as verdadeiras manifestações ou revelações da natureza e da vontade do Senhor.

f) As Escrituras ensinam a impossibilidade de se conhecer a Deus em Sua natureza transcendental (Jó 11.7; 1 Tm 3.16);

g) A finalidade das Escrituras é a de fazer Deus conhecido por Suas atividades na história e nas experiências que homens fiéis tenham com Ele (Rm 1.19).

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

A Existência de Deus


Introdução

As Sagradas Escrituras não se preocupam em provar a existência de Deus. Sua existência é fato estabelecido. Esta é a razão pela qual a Bíblia não oferece ao homem moderno qualquer prova racional quanto à existência de Deus. “No princípio criou Deus” (Gn 1.1), é o prólogo insofismável das Escrituras. Deus existe antes de tudo e de todos! Nesta simples e contundente afirmação a Bíblia nega:

a) o ateísmo: para o qual Deus não existe;

b) o politeísmo: para o qual existem muitos deuses;

c) o evolucionismo: para o qual a matéria evoluiu "continuamente";

d) o fatalismo: para o qual a vida surgiu do acaso, sem qualquer propósito;

e) o agnosticismo: para o qual Deus não pode ser conhecido.


A segunda parte da proposição sagrada não deixa de ser menos apologética: "... criou Deus os céus e a terra". Nesta verossímil afirmação a Escritura nega:

a) o panteísmo: que confunde Deus com a criação;

b) o materialismo: que afirmar a eternidade da matéria. [1]

A primeira declaração da Escritura acerca de 'Ĕlōhîm (O Criador, o Forte e Poderoso Senhor) é um testemunho irrefutável de sua existência soberana. O Senhor é 'Ĕl hashshāmāyin, isto é, o "Deus dos céus" (Sl 136.26), incapaz, portanto, de ser confundido com a criatura, ou como afirma o nome 'Ĕl 'ēchād, literalmente "o Único Deus" (Ml 2.10), impossível de ser confundido com outros deuses. Por conseguinte, a Sagrada Escritura só reconhece o Único e Soberano Deus de Israel.

Teorias que Negam a Existência de Deus

1. Ateísmo

O vocábulo ateu é formado pelo prefixo grego de negação a (“não”, “provação”, “negação”) e pelo substantivo theos, isto é, “deus” ou “Deus”. Literalmente, atheos significa “sem Deus”. A palavra “ateísmo”, no entanto, é formada pelos dois termos anteriores e o sufixo “ismo” que denota “doutrina”, “sistema”, ou “ensino”. O ateu é aquele que não crê em Deus, enquanto o ateísmo designa a filosofia ou os ensinos dos ateus. Ateísta é aquele que nega a existência de Deus e acredita que existam provas contra a existência do Divino.

O ateísta procura explicar todas as coisas a partir da matéria, do natural e visível. Nas Escrituras o ateísmo professo é considerado mais um problema moral do que filosófico ou existencial. O néscio (hb. nābāl)[2] que nega a Deus (Sl 14.1), não o faz por motivos filosóficos, mas pela suposição prática de que pode viver sem Ele (Sl 10.4). As Escrituras também reconhecem a possibilidade de “suprimir” de modo deliberado e, portanto, culpável, o conhecimento de Deus (Rm 1.18).

Segundo o contexto neotestamentário o ateísta não é apenas aquele que não crê na existência de Deus, mas pode ser também um teísta que não conhece o verdadeiro Deus: “Porque, ainda que haja também alguns que se chamem deuses, quer no céu quer na terra (como há muitos deuses e muitos senhores), todavia, para nós há um só Deus, o Pai, de quem é tudo e para quem nós vivemos; e um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas, e nós por ele” (1 Co 8.5,6). Em Efésios 2.12 lemos: “naquele tempo, estáveis sem Cristo [khōris Christou], separados da comunidade de Israel e estranhos aos concertos da promessa, não tendo esperança e sem Deus [theoi] no mundo”. (grifo nosso). O termo grego theoi, neste contexto, tem o sentido de “não pertencente a Deus”, “sem Deus”, em vez do significado corrente de negar racionalmente a existência de Deus, como o fazem os filósofos ateus. Esse ateísmo é mais prático e moral do que existencial e filosófico. Observe que theoi em Efésios, não pretende afirmar que a pessoa não crê em alguma divindade, mas que ignora a existência do Deus de Israel. É assim que devemos entender o advérbio de negação khōris, traduzido em diversas passagens por “separadamente”; “à parte de alguém”; “longe de alguém”. Literalmente a expressão khōris Christou, quer dizer “longe de Cristo”, “afastado de Cristo” e não antichristo, isto é, “contrário ou oposto a Cristo”.

2. Politeísmo

A expressão paulina em 1 Co 8.5 theoi polloi, isto é, “muitos deuses”, formam a palavra “politeísmo”. O politeísmo como sistema filosófico-religioso acredita que existem diversas divindades. Segundo Geisler o politeísmo "é a cosmovisão que afirma a existência de muitos deuses finitos no mundo". [3] Para o politeísta há o "deus da água, do fogo, da guerra" e assim por diante. O politeísmo, como anteriormente afirmamos, é uma forma de ateísmo, segundo o contexto do Novo Testamento. O politeísmo está engajado contra o monoteísmo cristão.

3. Agnosticismo

O termo agnosticismo é formado pelo "a" privativo ("não" – negação) e pelo substantivo "gnōsis" [4], isto é, "conhecimento"; literalmente "não-conhecimento". Agnosticismo é a filosofia religiosa que afirma a impossibilidade de se conhecer a Deus. Segundo o agnóstico não é possível saber se Deus existe ou não. O agnóstico critica o ateu e o teísta pelas pressuposições que assumem: a convicção de que Deus não existe e a certeza de que Deus existe. Por extensão, designa aquele que acredita que não existam provas suficientes para provar ou negar a existência de Deus. Teologicamente, o agnosticismo afirma que é impossível ao homem obter conhecimento a respeito de Deus. Não se pode provar ou refutar Sua existência. O agnosticismo é um sistema que contradiz a si mesmo, pois se não é possível saber com absoluta certeza, como eles mesmos estão certos de que não é possível negar ou confirmar a existência de Deus? Quando o vocábulo foi criado em 1869 por T.H. Huxley (1869) era usado para designar o ceticismo religioso.

4. Panteísmo

A palavra “panteísmo” procede do prefixo “pan”, "muito", "tudo", e do substantivo “theos”, literalmente significa “tudo é Deus”. Esta expressão refere-se aos sistemas religiosos que identificam Deus com o mundo. Para o panteísta tudo é Deus. O panteísmo confunde Deus com a natureza, o Criador com a criação: árvores, pedras, terra, água, todos são partes, segundo afirmam, de Deus (Rm 1.23). Deus e a criação são apenas um – indivisível, indissociável, imanente. O panteísmo também defende a imanência radical de Deus, pois crê que Deus está e é tudo. Como já observamos anteriormente, a Bíblia não confunde o Criador com a criatura, muito menos ensina a natureza como emanação divina. Deus, embora ativo na história, está separado das coisas criadas e controla toda a criação. Ele não é idêntico às criaturas, em menor ou maior grau. O panteísmo também nega o caráter pessoal de Deus ao identificá-lo com o mundo material.

5. Materialismo

O materialismo declara que a única realidade é a matéria, o tangível, as coisas concretas, não espirituais. Não crê na existência de Deus porque não O vê. Todas as coisas se explicam naturalmente e através dos agentes físicos e materiais. O materialismo, freqüentemente, tem sido colocado em oposição à vida, à mente, à alma ou ao espírito. Uma preocupação com a matéria tem significado, tradicionalmente, uma preocupação com os prazeres mundanos e os confortos físicos em contraste com o bem religioso e espiritual.

Afinal, é possível definir a Deus?

Todas e quaisquer definições intelectuais acerca de Deus se confinam à limitação humana: “Porventura, alcançarás os caminhos de Deus ou chegarás à perfeição do Todo-Poderoso” (Jó 11.7). Definir, em última análise, significa limitar. Envolve a inclusão do ser ou objeto definido dentro de uma determinada classe. Deus não pode ser satisfatoriamente definido. Ele é muito mais do que as palavras significam. O Eterno não está confinado aos sentidos da limitada linguagem humana. Hegel chamava de "consciência infeliz", o fato de o finito, o homem, tentar definir o Infinito, Deus. Temos neste ponto o desafio e confronto da linguagem apofática e catafática na teologia. A linguagem do Mistério e do revelado, do cognoscível e Incognoscível, do Transcendente e do imanente, o Deus dos filósofos e o Deus de Abraão. Como afirma a Bíblia a respeito de Deus, hā'ēl haggādôl wehannōrâ – "Deus, grande e terrível" (Ne 1.5; 4.14; 9.32; Dt 7.9). Quem é suficientemente sábio para compreender a sublimidade dessas palavras? Porém, a Bíblia declara a existência de Deus e revela seu caráter e natureza com bases racionais suficientes para se estabelecer um conceito coerente a respeito dEle, de seus atributos e natureza. Ninguém pode definir a Deus satisfatoriamente à parte daquilo que as Escrituras afirmam acerca de Deus. Lembremos, com muita humildade e devoção, que Deus não pode ser definido em sua natureza transcendente, pois Ele é o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último. Ele é O Eterno (Jo 1.18).

Notas

[1] Ver BAXTER, J.Sidlow. Examinai as Escrituras. São Paulo: Vida Nova, 1992, p.36.

[2] No hebraico "ser insensato", "tolo". O termo é usado para indicar a repugnância ou desprezo do hagiógrafo pelas pessoas que zombam da rocha de sua salvação (Dt 32.15) ou trata o pai com desdém (Mq 7.6). Deus torna o recalcitrante desprezível (Na 3.6). O termo enfatiza que a pessoa tem comportamento vil e vergonhoso. Moisés censurou sua geração, chamando-a de ‘am nābāl, “povo louco” (Dt32.6).Cf. R. Laird HARRIS (et al), Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento,1998,p.909-910.

[3] GEISLER, Norman. Enciclopédia de apologética. São Paulo: Vida, 2001, p. 707.

[4] No grego, conhecimento nos textos de Lc 1.77; 11.52; Rm 11.33; 1 Co 8.7,7,11. Com o genitivo significa o conhecimento pessoal de alguém (Fp 3.8).

TEOLOGIA & GRAÇA: TEOLOGANDO COM VOCÊ!



Related Posts with Thumbnails