DÁ INSTRUÇÃO AO SÁBIO, E ELE SE FARÁ MAIS SÁBIO AINDA; ENSINA AO JUSTO, E ELE CRESCERÁ EM PRUDÊNCIA. NÃO REPREENDAS O ESCARNECEDOR, PARA QUE TE NÃO ABORREÇA; REPREENDE O SÁBIO, E ELE TE AMARÁ. (Pv 9.8,9)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

FIDES ET RATIO - Fé e Razão


Fides et Ratio: Exigências e tarefas atuais. São Paulo: Edições Loyola, 1999, p.61-74.

Fides et Ratio trata da relação entre fé e razão e mais especificamente entre teologia e filosofia. Composta por sete capítulos[1], a Encíclica trata no último a respeito das Exigências e Tarefas Atuais da palavra de Deus (80-91) e da teologia (92-99). De modo geral, o documento expressa a importância do labor teológico e da investigação filosófica à compreensão do binômio fé e razão e da presença do homem no mundo.

1. A primeira seção do capítulo em epígrafe (80-91) apresenta uma síntese da perspectiva filosófica da Sagrada Escritura a respeito do homem e do mundo que, em Jesus Cristo, caminham para sua plenitude. Todavia, insurge sobre esse evento alguns percalços atuais. Dentre eles, a crise de sentido provocado pelo fenômeno da fragmentação do saber, cuja pluralidade de respostas procedentes das mais variegadas teorias agrava ainda mais a dúvida a respeito do sentido e contribui para o aumento do ceticismo e da indiferença do homem em relação à fé.

Diante deste quadro, o homem fecha-se ao transcendente dentro dos limites da própria imanência. É necessário, portanto, que a filosofia volte a encontrar a sua dimensão sapiencial, que se constitui na unificação do saber e do agir humano, a fim de que ambos sejam convergidos para um fim e sentido definitivos, que se encontram na religiosidade constitutiva de cada pessoa.

A segunda exigência que se faz à filosofia é verificar a capacidade de o homem chegar ao conhecimento da verdade, fato este que a Sagrada Escritura pressupõe apesar das mazelas humanas.

A terceira exigência refere-se ao retorno da filosofia à metafísica, isto é, que ela seja capaz de transcender os dados empíricos, sensíveis e fenomenológicos para chegar, na sua busca da verdade, a algo absoluto, definitivo e básico, cujo fundamento último é o próprio Deus. A urgência da instância metafísica ainda é mais evidente diante das ciências hermenêuticas e da análise linguística, pelo fato de alguns especialistas não se ocuparem em descobrir a essência da realidade, mas limitar-se apenas a exprimi-la e compreendê-la, aumentando assim a crise de confiança acerca da capacidade da razão.

A fé e a filosofia, portanto, devem prevenir-se contra os erros e desvios de alguns “ismos” filosóficos: ecletismo, historicismo, cientificismo, pragmatismo e niilismo. O primeiro pelo fato de unir ideias e concepções heterogêneas fora de seu contexto histórico. O segundo por negar o estado perene da verdade por compreendê-la e limitá-la a determinado período histórico. O terceiro por desconsiderar outras formas válidas de conhecimento e reduzir à razão tecnicista. O quarto por sua visão unidimensional e utilitarista do ser humano. O quinto, niilismo, que julgo ser dentre os demais ismos aquele que mais esvazia o homem e o mundo de sentido e se constitui um desafio para a fé cristã. Primeiramente, pelo fato de o niilismo atingir diversas áreas da vida humana. Segundo, o niilismo de matiz nietzschiano não apenas afirma a falta de sentido das coisas, mas encoraja ao ser a não procurá-lo. Ele proclama a morte do sentido. Na filosofia niilista resta ao homem o vazio, a desilusão em não encontrar um propósito, um sentido para a vida. Não existe, portanto, qualquer valor ou conceito de verdade, mas a falta deles. O homem está só. O mundo não avança em direção a um telos. O niilismo rejeita toda a verdade objetiva e lança o homem em um vazio, desespero e solidão. Na filosofia niilista não apenas as representações de Deus estão mortas, mas o próprio Deus.

2. A segunda seção do capítulo em análise trata das tarefas atuais da teologia, com destaque à renovação da metodologia teológica, tendo em vista um serviço mais eficaz à evangelização, a adequação da doutrina às exigências de nosso tempo, resguardando, contudo, seus aspectos fundantes, e a necessidade de se manter o olhar fixo sobre a verdade última confiada por meio da Revelação. Por conseguinte, o propósito fundamental que a teologia persegue é apresentar a compreensão da Revelação e o conteúdo da fé.

Todavia, surge a questão problemática entre o significado e a verdade, pelo fato de o teólogo laborar com a compreensão do mistério, que tem que ser individuado e exposto. Por conseguinte, a linguagem de Deus toma corpo na linguagem humana. A Revelação comunicada é mediatizada primeiramente pelas fontes que a descreveu na Escritura, transmitindo a verdade sobre o próprio Deus e refletindo a lógica da Encarnação. Por essa razão o teólogo deve se interrogar sobre qual seja a verdade profunda e genuína que os textos da Sagrada Escritura querem comunicar, muito embora esteja no invólucro e limite da linguagem.

Por tratar do mistério de Deus exige-se do hermeneuta a elaboração do intellectus fidei ligada à filosofia do ser. A teologia não pode estar dissociada da fé ao mesmo tempo em que precisa estar ligada a uma boa filosofia para explicitar o significado. A fé é conditio sine qua non para se compreender o mistério! É, portanto, necessário conciliar o caráter absoluto e universal da verdade com o inevitável condicionamento histórico e cultural das fórmulas que as exprimem.

Assim, portanto, a reflexão filosófica pode contribuir para esclarecer a relação entre verdade e vida, entre acontecimento e verdade doutrinal, e, sobretudo, a relação entre verdade transcendente e linguagem humana inteligível.

Esdras Costa Bentho



[1] Precedidos, obviamente, por uma introdução e conclusão.


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